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quinta-feira, 25 abril, 2024

Renato Rainha: “Evitamos compra de remédio com sobrepreço de 8.000%”

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SindSaúde DF
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Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Distrito Federal

Bacharel em Direito, pós-graduado em Ciências Políticas e em Direito Processual, Renato Rainha tomou posse na presidência do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) em 1º de janeiro deste ano para um mandato de dois anos. Numa entrevista exclusiva para o Fato Online, o presidente do TCDF falou, entre outras coisas, sobre como vê a situação financeira que o Distrito Federal atravessa, de que forma o Tribunal agiu para tentar evitar que ele chegasse no estágio atual e o que está fazendo para auxiliar a administração do DF a enfrentar a crise e evitar novos problemas.

Fato – O governo do Distrito Federal vai entrar este ano com um déficit de R$ 6,8 bilhões em caixa, sendo que R$ 3,7 bilhões são de restos a pagar. E o Ministério Público já entrou com essa ação em função dos aumentos concedidos pela gestão anterior aos servidores públicos. Está na justiça esta questão. São várias dívidas sem dinheiro em caixa para bancar. Isso pode ser considerado irresponsabilidade fiscal?
Rainha – Veja bem, todos esses dados e todos esses valores ainda estão sendo checados, até porque a dívida não está consolidada. Existe uma parte dessa dívida que ainda está em processo de reconhecimento, e o governo não encaminhou ainda esse reconhecimento, essa conta final, para o tribunal de contas. Nós estamos fazendo já levantamentos dos dados que nós recebemos. Agora, o que que pode ser considerado irresponsabilidade fiscal, e eu falo em tese, porque, de repente, eu possa ter que voltar nesse processo aqui no tribunal. Em tese, o artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal diz o seguinte: que nenhum governo, no último ano do mandato, pode deixar dívida para o outro governo que vai sucedê-lo, se não deixar o financeiro, se não deixar o dinheiro.

Fato – Mas eu pergunto o seguinte: essa penalidade seria para o governo atual, ou vai de alguma forma penalizar o governo anterior?

Rainha – Não, a penalidade é para o governo que deveria ter deixado recursos financeiros. Ou seja, o governo anterior.

Fato – E qual seria o tipo de penalidade à qual o governador anterior poderia ser submetido?

Rainha – Todo aquele que descumprir o artigo 42 da lei de responsabilidade fiscal, pode ter a seguinte penalidade, que é a penalidade mais grave que um gestor pode receber, que é o tribunal e a Câmara Legislativa – já que este julgamento é conjunto – julgarem as contas do governador irregulares. Isso significa que o tribunal, em parecer, e a Câmara, em julgamento, reconhecem que aquela gestão foi uma gestão ilegal e ineficiente. Então, gera-se irregularidade. A irregularidade pode gerar inelegibilidade, a pessoa perde a capacidade de participar de eleições. Além disso, se no decorrer das apurações ficar comprovada fraude, desvio de dinheiro, atos de improbidade, toda a documentação é encaminhada para o Ministério Público, para as ações competentes. Ação civil Pública no caso de improbidade e ação penal no caso de crimes. Além disso, todo aquele responsável, todo aquele gestor que for responsável por desvio de recursos, ele pode ser condenado a devolver os recursos que foram desviados, corrigidos, e ainda pode ter uma multa no valor do que foi desviado.

Fato – E como fazer a prevenção?

Rainha – É essa a grande questão que nós estamos atuando. É no sentido de fazer a prevenção. Eu reuni aqui no tribunal praticamente todos os secretários do governo, administradores regionais e presidentes de estatais e diretores exatamente para mostrar para cada gestor, dentro da sua pasta governamental, onde foram identificados erros em momentos anteriores, ilegalidades em anos anteriores, para que ele adote providências no sentido de impedir que esses erros continuem acontecendo, que essas ilegalidades venham a acontecer. E nós vamos fazer cada vez auditorias mais próximas do fato, com o resultado da auditoria mais rapidamente e até prevenindo antes que o fato ocorra para impedir que o dano venha a acontecer. Nós sabemos que depois que o dano acontece a gente pode até punir o responsável, mas trazer o dinheiro de volta é algo extremamente difícil.

Fato – O senhor poderia dar um exemplo prático dessa prevenção? Por exemplo, o gestor de uma secretaria resolve fazer uma obra. Ele pode chegar antes ao tribunal de contas e falar: “Olha, eu quero realizar isso, vocês podem me acompanhar? Vocês podem mandar um fiscal para evitar que eu cometa erros?”

Rainha – Eu vou lhe dar um exemplo concreto que considero interessante. Um governo em determinado momento lançou uma licitação para comprar remédio, e nós suspendemos a compra desse remédio. Não foi feita. Por quê? Porque na nossa pesquisa, nós vimos que um dos remédios cotados estava com 8.000% de sobrepreço. O valor do remédio era da ordem de R$ 38,00, e ele estava sendo cotado para ser comprado por R$ 3.390. O tribunal, então, suspendeu essa licitação preventivamente e impediu que fosse feita a compra nesses valores totalmente absurdos. Um outro exemplo é quando foi feito o cálculo do guarda-corpo do estádio nacional, que é aquele ferro que fica na frente das cadeiras para que o torcedor não caia quando for comemorar o gol. Nós conseguimos identificar ali 15 quilômetros de guarda-corpo a mais do que realmente seria gasto, e aí nós chegamos antes da despesa ser feita.

Fato – Vou ser um pouco indiscreto. Essa compra de remédios foi nesse governo ou no governo anterior?

Rainha – Não, foi no governo anterior. Nós suspendemos a licitação e ainda apontamos um caminho para que a Secretaria de Saúde não ficasse sem o remédio. Havia algumas atas de registro de preço que tinham esse remédio no valor de R$38,00, e o GDF poderia aderir àquela ata e comprar o remédio para não desabastecer a rede de saúde.

Fato – No final da gestão Agnelo e agora no início dessa gestão, muitos problemas explodiram. O ex-governador, ele foi advertido em algum momento durante a gestão dele que havia esses problemas?

Rainha – Por diversas vezes. Por exemplo, na questão de gasto com o pessoal. O tribunal, durante o exercício de 2014, expediu três alertas conforme determina a Lei de Responsabilidade Fiscal, mostrando para o governo que ele estava acima do limite de alerta, depois acima do limite prudencial e determinando ao governo que adotasse providências no sentido de impedir que esses limites fossem “desobservados.”

Fato – O senhor mencionou os três alertas que o tribunal fez com relação a gasto de pessoal. Houve outros?

Rainha – No ano passado, nas contas de 2013, o tribunal fez vários alertas ao governador, e eu inclusive votei pela irregularidade das contas porque o governo gastou R$ 1,2 bilhão a mais do que tinha arrecadado em 2013. E tínhamos mais de R$ 200 milhões de serviços prestados na Secretaria de Saúde sem cobertura contratual. O tribunal fez vários alertas e, nesse caso, o tribunal foi bastante duro para mostrar para o governador e determinar a ele que adotasse as providências.

Fato – Esse aumento que ele concedeu no final do governo, ali no período eleitoral, e que hoje é motivo de discussão, inclusive, de ação do Governo do Distrito Federal no tribunal, ele foi avisado disso?

Rainha – Olha, com relação ao alerta, nós estamos checando agora, porque foi uma aprovação na Câmara Legislativa e os efeitos ainda não se deram. Há uma representação do Ministério Público aqui e nós estamos checando. Agora, é preciso verificar com relação ao aumento se existe adequação orçamentária também. Se existe adequação na Lei de Diretrizes Orçamentárias. E é isso que o MP também está questionando, me parece que no Poder Judiciário.

Fato – Quando a Câmara aprova um aumento desse que ultrapassa o limite, ela também pode ser punida?

Rainha – Em termos de punição não, porque o Poder Legislativo é independente. Mas certamente que qualquer aumento, qualquer ato cometido ao arrepio da legislação, ele pode ser anulado. Seja no Judiciário, seja no Tribunal de Contas. Nós conversamos com o governador aqui no tribunal. Ele veio fazer uma visita aos conselheiros. Veio acompanhado da procuradora-geral, do consultor jurídico, e nós tratamos exatamente dessa situação. O governador fez essas observações, nós ouvimos, mas nós dissemos também que existe todo esse histórico dos servidores, essas perdas salariais. E tem que se verificar a questão da legalidade, buscar também um aumento de receitas. Isso é fundamental. Buscar enxugar desperdícios na máquina governamental, isso é fundamental. O combate rigoroso à corrupção. Buscar outras fontes de receita. Por exemplo, a regularização de condomínios. Quantos imóveis nós temos hoje no Distrito Federal que estão irregulares e que podem ser regularizados sem ofensa à lei ambiental? E o governo pode receber por esses imóveis. Quantas dívidas o GDF tem. e que pode buscar essas dividas? O Fundo de Dívida Ativa (Fedat) tem que ser avaliado. O Fedat é você pegar as dívidas de tributos que o cidadão tem, que os empresários têm com o governo, e vender essa dívida para alguém. E o governo arrecadaria esses valores e colocaria no seu orçamento.

Fato – Uma das soluções que este governo adotou, esta gestão, foi auditar os contratos da gestão passada, para ver se encontrava atividades que não tinham sido realizadas ou irregularidades que não precisassem ser pagas. Que outros contratos vocês estão auditando e o que o senhor pode falar sobre o que já foi encontrado?

Rainha – Eu recebi aqui o secretário de Fazenda e a secretária de Planejamento. Eles exatamente vieram me mostrar que estão fazendo uma checagem em cada um desses contratos. E em cada um, esse reconhecimento de dívida de pessoas que falaram “eu prestei serviço”, “eu fiz obra” ou “eu fiz fornecimento de produto” e não recebi. O governo está fazendo essa checagem e vai apresentar para o tribunal. Até o primeiro momento, eles estão achando que isso vai dar em torno de R$ 1,2 bilhão. Mas não são números fechados ainda.

Clique aqui para ver a entrevista.

Fonte: Fato Online

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